7 de out. de 2011

Ney aí

Ramiro Simch
@miroez

Luiz Ney acordava. Aguava o rosto, punha roupa e saía. No ombro o caixote aninhado, pesado. Os moradores da Rua Águia sofriam: o que vai dentro do baú do Luiz Ney?

Passeava garboso, leve rebolado, elegante apesar do fardo. Não cumprimentava vizinho nenhum. Era só queixo empinado e autossuficiência, até alcançar o nono número da rua (vindo de lá pra cá).

Na frente do sobrado vermelho ele abria um sorrisinho, suingava mais ainda, e de sobrolho focava o rapazote debruçado na sacada. Este retrucava com malícia equivalente, analisando dos tornozelos ao rabo de cavalo o cabeleireiro atlético. Tais rituais de platonismo amoroso duravam só os cinco segundos necessários para Luiz Ney chegar às lajotas de basalto da próxima casa, mas eram intensos.

Logo Luiz Ney voltava ao normal, reignorava o mundo e a mocinha que também o observava com desejo. E lá se ia com o caixote. As velhinhas da Rua Águia achavam uma indecência provocar tanta curiosidade.  

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